17/12/2020

Aspirações à vida eterna – Poema de Santa Teresa d’Ávila

Você já escreveu algum poema para o seu amado ou sua amada? Santa Teresa já!

 

Aliás, são inúmeros os poemas que Santa Teresa de Jesus escreveu com a sua alma enamorada por Deus. Em Aspirações à vida eterna, vemos o quanto Teresa desejava estar já plenamente unida com Deus no Céu. Seu desejo era tanto, que a Santa escreve em cada estrofe: “Que morro de não morrer”.

 

Cada poema de Santa Teresa é um grande tesouro, podemos rezar, meditar com eles e elevar a nossa alma a Deus!

 

Aspirações à vida eterna

 

 

Vivo sem em mim viver

 

E tão alta vida espero,

 

Que morro de não morrer.

 

 

Vivo já fora de mim

 

Desde que morro de amor;

 

Porque vivo no Senhor,

 

Que me escolheu para Si.

 

Quando o coração lhe dei,

 

com terno amor lhe gravei:

 

Que morro de não morrer.

 

 

Esta divina prisão,

 

do amor em que eu vivo,

 

fez a Deus ser meu cativo,

 

e livre meu coração;

 

e causa em mim tal paixão

 

ser eu de Deus a prisão,

 

Que morro de não morrer.

 

 

Ai que longa é esta vida!

 

Que duros estes desterros!

 

Este cárcere, estes ferros

 

onde a alma está metida!

 

Só de esperar a saída

 

me causa dor tão sentida,

 

Que morro de não morrer..

 

 

Ai! Como a existência é amarga

 

Sem o gozo do Senhor!

 

Se é doce o divino amor,

 

Não o é a espera tão larga:

 

Tire-me Deus esta carga

 

Tão pesada de sofrer,

 

Que morro de não morrer.

 

 

Só vivo pela confiança

 

De que um dia hei de morrer;

 

morrendo, o eterno viver

 

Tem por seguro a esperança.

 

Ó morte que a vida alcança,

 

Não tardes em me atender,

 

Que morro de não morrer.

 

 

Olha que o amor é bem forte!

 

Vida, não sejas molesta;

 

Vê, para ganhar-te resta

 

Só perder-te: - feliz sorte!

 

Venha já tão doce morte;

 

Venha sem mais se deter,

 

Que morro de não morrer.

 

 

Lá no céu, definitiva,

 

É que a vida é verdadeira;

 

Durante esta, passageira,

 

Não a goza a alma cativa.

 

Morte, não sejas esquiva;

 

Mata-me para eu viver,

 

Que morro de não morrer.

 

 

Vida, que posso eu dar

 

a meu Deus que vive em mim,

 

se não é perder-me enfim,

 

para melhor o gozar?

 

Morrendo, o quero alcançar,

 

pois nele está meu socorro,

 

Que morro de não morrer.

 

 

Se ausente de meu Deus ando,

 

Que vida há de ser a minha

 

Senão morte, mais mesquinha,

 

Que mais me vai torturando?

 

Tenho pena de mim, quando

 

Me vejo em tanto sofrer,

 

Que morro de não morrer.

 

 

Já de alívio não carece

 

O peixe em saindo da água,

 

Pois tem fim toda outra mágoa

 

Quando a morte se padece.

 

Pior que morrer parece

 

Meu lastimoso viver,

 

Que morro de não morrer.

 

 

Se me começo a aliviar

 

Ao ver-te no Sacramento,

 

Vem-me logo o sentimento

 

De não poder gozar.

 

Tudo aumenta o meu penar,

 

Por tão pouco assim te ver,

 

Que morro de não morrer.

 

 

Quando me alegro, Senhor,

 

Pela esperança em ver-te,

 

Penso que posso perder-te,

 

E se dobra a minha dor:

 

E vivo em tanto pavor,

 

Sem na espera esmorecer,

 

Que morro de não morrer.

 

 

Oh! Tira-me desta morte,

 

E dá-me, Deus meu, a vida;

 

Não me tenhas impedida

 

Por este laço tão forte.

 

Morro por ver-te, de sorte

 

Que sem ti não sei viver,

 

Que morro de não morrer.

 

 

Choro a minha morte já;

 

E lamento a minha vida,

 

Enquanto presa e detida

 

Por meus pecados está.

 

Ó meu Deus, quando será

 

Que eu possa mesmo dizer

 

Que morro de não morrer?